quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Atualidade de Fátima.


Por Hermes Rodrigues Nery
Caminho na Cova da Iria - Foto: Hermes Rodrigues Nery.
Caminho na Cova da Iria – Foto: Hermes Rodrigues Nery.
No dia 12 de outubro deste “Ano da Fé”, quando celebramos, no Brasil, a festa de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Bento XVI recebeu no Vaticano, no mosteiro Mater Ecclesiae, onde está recolhido, a imagem de Nossa Senhora de Fátima. Sob sua coroa está a bala que feriu o beato João Paulo II, em 1981, na praça de São Pedro. Ratzinger foi o primeiro a rezar, tornando relevante este gesto, em meio a tudo o que está acontecendo em 2013, na vida da Igreja. Significativo, portanto, o fato de que dos dois “bispos vestidos de branco” que atualmente residem no Vaticano, Bento XVI foi quem rezou primeiro.
Sobre a mensagem de Fátima, Bento XVI, em 11 de maio de 2010, no avião, em sua chegada a Portugal, destacou “… a resposta verdadeira e fundamental que a Igreja deve dar, que nós, cada pessoa, devemos dar nesta situação. A novidade que podemos descobrir hoje, nesta mensagem, reside também no fato que os ataques ao Papa e à Igreja vêm não só de fora, mas que os sofrimentos da Igreja vêm justamente do interior da Igreja, do pecado que existe na Igreja. Também isso sempre foi sabido, mas hoje o vemos de um modo realmente terrificante: que a maior perseguição da Igreja não vem de inimigos externos, mas nasce do pecado na Igreja.”
E mais uma vez retomamos à pergunta do porque a consagração a Nossa Senhora (realizada por Pio XII e João Paulo II — já que Francisco evitou a expressão “consagração”, preferindo realizar um ”ato de entrega”) foi genérica, ao mundo, quando ela própria ordenou que fosse consagrada especificamente a Rússia, a fim de que os erros desta nação não se espalhassem pelo mundo.
Enquanto São Pio X foi contundente em rechaçar o modernismo, “síntese de todas as heresias”, falta hoje, com mais vigor, que a Igreja recobre coragem para denunciar quais são os inimigos que “vêm justamente do interior da Igreja”, como salientou Bento XVI, e que agem corroendo por dentro a sã doutrina. Tais inimigos internos (infiltrados e hoje muitos deles em postos de decisão) são os que trabalham com estratégia gramsciana para agravar cada vez mais “o pecado que existe na Igreja”, pois agem com sutileza e sofisticação semântica, contra Cristo.
As potências que manipulam de modo anônimo
Em “Jesus de Nazaré”, Bento XVI escreveu que “estamos todos na realidade presos pelas potências que de um modo anônimo nos manipulam”. O mesmo dissera Woodrow Wilson, há quase cem anos, quando se referiu à existência em algum lugar, de “um poder tão organizado, tão sutil, tão atento, tão interligado, tão completo, tão disseminado”, que trabalha nas sombras,  com uma tal eficácia, de causar assombro. Há mais de um século, instituições financeiras juntaram volumosas somas de riqueza material, beneficiadas por omissões e brechas nas legislações, e toda espécie de astúcia, até formarem um bloco de vasto poder, agindo como um polvo de mil tentáculos, que a tudo abarca e manipula, e impõe as mais estranhas ideologias do mal, alcançando capilarmente toda a sociedade, inclusive a Igreja.
As novas ideologias que tomaram força em sentido contrário ao cristianismo também se inseriram no seio da Igreja, provocando, em muitos meios e movimentos, a dissociação da caridade e da verdade e, por conseqüência, a hesitação da fé. Todas estas forças sintetizadas na heresia modernista, condenada inequivocamente por São Pio X no início do século XX, atuam hoje, de modo mais intenso, num processo de desconstrução e desmonte civilizacional. Com a omissão e a conivência de muitos dentro da Igreja, as estruturas de pecado ampliaram-se de tal forma que hoje tem sido cada vez mais difícil defender a sã doutrina. Em passado glorioso, os homens da Igreja resistiram, em altos graus de heroicidade, tendo os Papas como baluartes na defesa do tesouro da fé. São Pio X, já citado, foi um dos santos mais heroicos nesta batalha espiritual, pois os santos, nas horas graves da Igreja, sinalizam a continuidade apostólica e sabem que defender a verdade significa lutar por ela.
Como salientou Bento XVI na homilia inaugural de seu pontificado, “amar é estar pronto para sofrer”. Neste mundo, o sofrimento é o preço por resistir ao mal (é o que pedimos a Nosso Senhor Jesus Cristo, rezando no Pai Nosso: “livrai-nos do mal”). Por isso “a Igreja tem de ser força de resistência”, ressaltou Ratzinger, em “O Sal da Terra”. Custe o que custar, doa a quem doer: “Prega a palavra, insiste, quer agrade quer desagrade, repreende, adverte, exorta com toda a paciência e doutrina” (II Tim, 4, 2). 
Como vemos diante de nossos olhos, “os erros da Rússia”, advertidos por Fátima, não foram erradicados. Antes, se estenderam e os seus efeitos de corrosão aí estão, com mais força ainda hoje: descaracterização de conceitos, modificação de mentalidade, com meias verdades e ambiguidades, para que as novas gerações passem a aceitar sem resistência o veneno do pecado como algo aparentemente inofensivo. É isso: voltamos à tragédia adâmica do Gênesis, com a mesma tentação: “sereis como deuses!” E a mesma indagação: “Por que não provar do fruto proibido?” E assim, as potências de modo anônimo, aludidas por Woodrow Wilson e Bento XVI, continuam a trabalhar nas sombras, no afã de substituir Deus por Leviatã. 
“Quando se pensa que a Igreja deveria ser uma imitação do Estado, não se compreende a essência da própria Igreja”, ressaltou Ratzinger, em O “Sal da Terra”. O que se quer? Flexibilizar a moral católica em nome de uma “nova antropologia?”, considerar a defesa dos “valores inegociáveis” da sacralidade da vida humana como obsessão? São questões que hoje angustiam e requerem reflexão e fortalecimento na oração, para o verdadeiro discernimento. 
A novidade da mensagem de Fátima – ressaltou Bento XVI há tão pouco tempo – é que “os sofrimentos da Igreja vêm justamente do interior da Igreja”. E conclui enfaticamente o Papa Ratzinger — que nossos ouvidos ouçam: “Também isso sempre foi sabido, mas hoje o vemos de um modo realmente terrificante: que a maior perseguição da Igreja não vem de inimigos externos, mas nasce do pecado na Igreja”.
Os cristãos são sempre chamados à oração e à vigilância, inspirados no exemplo dos santos. O que não podemos é aceitar que a Igreja seja instrumentalizada por Leviatã. Cristo venceu o mundo! Sabemos disso! A razão da nossa fé está em Cristo Ressuscitado, daí a fidelidade à sã doutrina.

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