G1 – Os advogados do padre Roberto Francisco Daniel, conhecido como padre Beto, excomungado da Igreja Católica pela Diocese de
Bauru (SP) no final de abril deste ano, protocolaram na Justiça um pedido de medida cautelar para obter o direito de defesa no processo canônico que proibiu o religioso de celebrar e frequentar missas.
Antonio Celso Galdino Fraga, advogado do padre e especialista na área, diz que vai até onde for preciso para conquistar o direito de defesa. “Por uma questão de bom senso, a Diocese de Bauru pode resolver essa questão de uma forma inteligente, anulando o processo que inicialmente instaurou contra o padre Beto, iniciando um novo. Desde que respeitando o devido processo legal. E nós como advogados, estaremos aptos a defender o nosso cliente até o com o Santo Padre em Roma se for preciso”.
Uma ação deverá ser protocolada daqui a 20 dias. Os advogados acreditam que o caso é inédito na Justiça brasileira. “A ação principal será proposta provavelmente em 20 dias. O Código de Processo Civil estabelece o prazo de 30 dias da concessão da liminar, mas estamos propensos a ajuizar a ação anulatória. Talvez seja o primeiro caso que a Justiça brasileira enfrente oriundo de um processo eclesiástico. Tivemos no passado a notícia só da Suprema Corte reconhecendo a sua soberania para julgar a Igreja Católica instituída nos Estados Unidos em ações indenizatórias que pessoas propuseram por atos que caracterizariam abuso sexual no passado. Esperamos que a Justiça brasileira também se pronuncie no mesmo sentido de que a Diocese de Bauru, enquanto pessoa jurídica de direito privado, criada, organizada e submissa, portanto, ao nosso ordenamento jurídico, respeito a Constituição, anule esse processo que foi instaurado contra o padre Beto permitindo-lhe se defender”, enfatizou Fraga.
O advogado informou também que a Constituição Brasileira tem que ser respeitada. E que padre Beto deve ter a chance de defesa. “Com um decreto de 2010, que é uma concordata, ficou muito claro que no exercício das atividades, das confissões, que são as instituições que a igreja mantém no Brasil, como a Cúria, a Diocese, todas são confissões. Elas têm de observar no exercício de suas atividades permitidas pelo Brasil enquanto estado laico, que respeitem a nossa Constituição e o nosso ordenamento jurídico. Então, no caso de uma excomunhão automática sem o respeito do devido processo legal, com acesso ao processo, instituição de um advogado para realizar os atos de defesa e execução de defesa propriamente, isso é incompatível e inaplicável no Brasil”.
Declarações polêmicas sobre temas como a homossexualidade, fidelidade e a necessidade de mudanças na estrutura da Igreja Católica, todas publicadas nas redes sociais, foram os motivos alegados pela Diocese, que excomungou Padre Beto por heresia e cisma. “São duas acusações sérias. O padre não teve condições de questionar a excomunhão que lhe foi aplicada. Ainda mais para ele, que foi ordenado, enfim, a ligação com a Igreja Católica, de não poder na circunstância que se encontra, de receber o sacramento. E até a extrema unção na hipótese de morte para ter a salvação”, completou Antonio Fraga. Ao lado dele no caso está o advogado Tito Costa.
‘Quero voltar’
Em meio aos conflitos, padre Beto lançou na noite de terça-feira (30), em Bauru, o livro intitulado “Verdades Proibidas”. Ele afirmou ao G1 que a ação na Justiça é para conseguir o direito de defesa da decisão da Igreja Católica e tentar reverter a decisão da excomunhão. “Nenhuma instituição pode fazer isso com uma pessoa. Me senti um adolescente em um internato. Quero voltar a celebrar missas. Não deixei de ser padre. Não foi uma decisão minha. Continuo me sentindo um padre”.
A Diocese de Bauru preferiu não se manifestar sobre o assunto.
Papa x Homossexualismo
Um dos motivos da excomunhão de padre Beto seriam as declarações polêmicas sobre o homossexualismo, por exemplo. Durante a visita do Papa Francisco ao Brasil na semana passada, uma declaração chamou a atenção. O pontífice disse que “se uma pessoa é gay e busca a Deus, quem sou eu para julgá-la?”.
O discurso e a postura do Papa tiveram a aprovação do padre bauruense. “Ele mostrou que devemos pensar teologicamente. Racionar e refletir. São novas realidades que estamos vivendo. Não podemos seguir uma cartilha. Temos que pensar como Deus agisse. O Papa Francisco mostrou claramente que a discussão é algo necessário. E isso é o que tentei fazer durante toda minha vida como padre. A postura é essa. É preciso revisar”.
De acordo com o padre, a decisão de entrar com a ação partiu antes da vinda do Papa ao Brasil. “Já estava decidida antes porque não tivemos acesso ao processo. Assinei uma procuração para os meus advogados no início de julho”.
No entanto, ele também afirmou que está mais motivado e confiante com as declarações do pontífice em relação a temas polêmicos. “Deixa a gente mais confiante. A vinda do Papa nos animou com suas declarações. A postura dele de ser gente como a gente. Com uma postura teológica do encontro e não do afastamento. Ele resgata a questão da igreja do povo de Deus”.
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Escreve a gentil leitora que nos indicou o artigo e a quem agradecemos a informação:
O Sr. Roberto pretende voltar… E ele buscou as vias judiciais para tanto! Esperou o final da JMJ e distribuiu medida cautelar ontem contra a Diocese de Bauru. Não sou de Bauru, mas algum correspondente lá pode tentar pegar cópia da Inicial e ver seu pedido. Pela reportagem, quer o exercício pleno do contraditório no “processo” de excomunhão ?!?!… O advogado entende que o Estado pode obrigar a Igreja a rever o caso do mesmo… Preocupada mais com a tese de fundo do que com o pedido, localizei a ação e fiquei acompanhando on-line o andamento do processo, e há pouco, o Juiz da 6ª Vara Cível de Bauru indeferiu o pedido liminar do Sr. Roberto Francisco Daniel. Segue abaixo cópia do despacho e seus fundamentos, os quais não tive tempo hábil de analisar. Cabe recurso.
Processo | CÍVEL |
Comarca/Fórum | Fórum de Bauru |
Processo Nº | 0027122-18.2013.8.26.0071 |
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Cartório/Vara | 6ª. Vara Cível |
Competência | Cível |
Nº de Ordem/Controle | 1206/2013 |
Grupo | Cível |
Classe | Cautelar Inominada |
Assunto | |
Tipo de Distribuição | Livre |
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Distribuído em | 29/07/2013 às 17h 56m 08s |
Moeda | Real |
Valor da Causa | 1.000,00 |
Qtde. Autor(s) | 1 |
Qtde. Réu(s) | 1 |
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PARTE(S) DO PROCESSO | [Topo] |
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Requerido | DIOCESE DE BAURU DO DIVINO ESPIRITO SANTO |
Requerente | ROBERTO FRANCISCO DANIEL Advogado: 6550/SP ANTONIO TITO COSTA Advogado: 131677/SP ANTONIO CELSO GALDINO FRAGA |
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ANDAMENTO(S) DO PROCESSO | [Topo] |
| (Existem 6 andamentos cadastrados .) |
31/07/2013 | Autos no Prazo – exped. c |
31/07/2013 | Decisão ProferidaVistos. O autor ajuíza ação cautelar preparatória inominada, apontando a nulidade de ato jurídico como fundamento da lide principal. Invoca a violação ao devido processo legal pela imposição da excomunhão latae sententia; ou seja, pela punição automática reservada aos casos mais graves de delitos previstos no Código de Direito Canônico. E para ser reabilitado imediatamente aos sacramentos, alega o periculum in mora. No entanto, o perigo da demora não está presente, daí a ausência dos requisitos da tutela cautelar liminar. Alguns pecados particularmente graves são passíveis de excomunhão, a pena eclesiástica mais severa, que impede a recepção dos sacramentos e o exercício de certo atos clericais. Neste caso, a absolvição não pode ser dada, segundo o direito da Igreja, a não ser pelo Papa, pelo Bispo local ou por presbíteros autorizados por eles. (Catecismo da Igreja Católica, Fidei Depositum, § 1463). Logo se vê que a excomunhão imposta autor não é pena definitiva, – mera pena medicinal – , até porque tal conceito conflita com a misericórdia divina: “Todo o pecado e blasfêmia serão perdoados aos homens; porém, a blasfêmia contra o Espírito Santo, não lhes será perdoada. E todo o que disser alguma palavra contra o Filho do Homem, ser-lhe-á perdoada; porém, o que disser contra o Espírito Santo, não terá perdão neste mundo nem no outro (Mateus, 12, 30-31) Assim, para fazer valer a revisão da excomunhão, o cânone 1.354 prevê a cessação das penas pela remissão ou perdão concedido pela autoridade competente. E o cânone 1.356 §1º, prevê a autoridade competente para a remissão dos delitos feredae ou latae setentia. De sorte que inexiste periculum in mora no caso dos autos. Se o autor teme a ineficácia do provimento jurisdicional se deferido apenas ao final da cognição exauriente do processo principal, ou seja, se teme ficar privado dos sacramentos até o final do processo, bastaria a providência extrajudicial consistente no pedido de absolvição ao ordinário local, a qualquer Bispo em ato de confissão sacramental (cân. 1355, §2º), ou ainda ao Romano Pontífice, de quem o autor já declarou acreditar na revisão da pena . Escreve Humberto Theodoro Júnior que o perigo de dano refere-se, portanto, ao interesse processual em obter uma justa composição para o litígio, seja em favor de uma ou de outra parte, o que não poderá ser alcançado caso se concretizar o dano temido (Curso de Direito Processual Civil, vol. 2, pág. 340). Daí se inferir que o interesse para a obtenção da medida liminar não se faz presente no caso dos autos, dada a existência de meio extraprocessual para se obter a proteção aos direitos judicialmente discutidos. O perigo da demora nem sequer atinge o direito do autor ao último dos sacramentos, pois a unção dos enfermos só é vedada aos que perseverarem obstinadamente em pecado grave manifesto (cânone 1.007). Ainda sobre o requisito do perigo, inexiste informação nos autos de que o autor tenha se utilizado das vias impugnativas previstas no Código Canônico. O cânone 1628 prevê o recurso da apelação, com efeito suspensivo (cân. 1639), disponível a qualquer parte que se julgar prejudicada por alguma sentença, não figurando, a decisão de excomunhão dentre os atos insuscetíveis de apelação (cânone 1629). Além disso, até mesmo a sentença transitada em julgado admite a restitutio in integrum, caso ela tenha sido preferida com evidente negligência de alguma prescrição (cân. 1.645, §4º), como alega o promovente quanto ao devido processo legal. Ademais, a afronta ao direito de defesa, também invocado pelo acionante, justifica a querela de nulidade prevista no cânone 1.620, 7º, deduzida junto ao próprio juiz ordinário ou delegado que proferiu a sentença (Cruz e Tucci e Azevedo. Lições de Direito Processual Civil Canônico, pág.152, Ed RT). Por fim, no arsenal de meios de impugnação da sentença também está prevista a apelação per saltum diretamente ao Romano Pontífice (favorável às opiniões do autor, segundo manifestação deste à imprensa), caso o autor tenha dúvidas sobre a imparcialidade dos tribunais inferiores: A partir do momento em que se estruturou a hierarquia eclesiástica, permite-se que, per saltum qualquer causa seja levada à apreciação do Papa. (ob. cit, pág. 147). Em síntese, porque não esgotadas as vias impugnativas extrajudiciais, também por isso o autor não reúne os requisitos da medida liminar. E sobre o uso das vias impugnativas canônicas, é importante mencionar que a decisão pública a folhas 32 – disponível na web – é suficiente para a instrução dos recursos, não sendo verossímil, ao menos nesta fase de cognição sumária, a alegação de que a ré deliberadamente obstaculiza o acesso do autor à defesa nos meios canônicos. Ademais, força convir a incongruência da alegação de nulidade do processo penal canônico por vício formal, com a retomada da aptidão para receber os sacramentos, sem com que haja uma efetiva comunhão do fiel com a fé preconizada pela igreja, em cujo corpo o autor pretende ser reintegrado por decisão secular. Santo Agostinho define os sacramentos como o sinal visível externo de uma graça espiritual, interna (Keeley, Robin, org., Fundamentos da Teologia Cristã, pág. 343. Ed Vida). Logo, até poder-se-ia argumentar que uma decisão liminar conferiria ao autor a retomada dos sacramentos como mero sinal externo da graça espiritual, i. .e, um lugar na mesa eucarística. No entanto, a graça interna, consistente na participação na vida divina (Catecismo, pág. 460), na associação do fiel à obra da Igreja, não há decisão judicial que garanta. A graça compreende igualmente os dons que o Espírito nos concede para nos associar à sua obra, para nos tornar capazes de colaborar com a salvação dos outros e com o crescimento do corpo de Cristo, a Igreja (ob. Cit, pág; 460). Vale dizer, a declaração de ineficácia da excomunhão por vício formal do processo canônico até pode garantir a reintegração do autor ao corpo formal da igreja, mas não teria o condão de reintegrá-lo à comunhão com o corpo místico de Cristo : Igreja Triunfante, constituída pelas almas que já se encontram no Céu; Igreja Padecente, constituída pelas almas do purgatório; e Igreja Militante, constituída pelos os fiéis na terra que comungam a mesma fé, segundo os preceitos ditados pelas cabeças invisível – Jesus Cristo – e visível – o Papa – desse corpo (Carta Encíclica Mysticy Corporis) E o sinal de unidade da Igreja, assim entendida como o Mysticy Corporis , é dado pela eucaristia, ou seja, pelo sinal da comunhão, do qual o acionante encontra-se privado por iniciativa própria. Fosse o vício formal do processo canônico igual ao da exclusão de um associado de clube recreativo, por exemplo, não haveria outras implicações na reintegração liminar. Mas a elisão da excomunhão tão só pelo vício formal não reintroduziria o acionante nos quadros da associação cuja profissão de fé negou (apostasia – fato incontroverso -, segundo o decreto de excomunhão) e o levou a ser dela excluído. Afora isso, a reinserção judicial do autor entre os fiéis, sem com que haja a sintonia dele com os preceitos da Igreja, não encontra amparo no direito canônico. Segundo o cânone 209, Os fiéis são obrigados a conservar sempre, também no modo próprio de agir, a comunhão com a igreja. §2º Cumpram com grande diligência os deveres a que estão obrigados para com a Igreja universal e para com a Igreja particular à qual pertencem de acordo com as prescrições de direito. Em suma, a efetiva reincorporação do autor aos sacramentos passa ao largo da discussão formal do processo de excomunhão. Para a retomada do elo entre o promovente e a igreja, é necessária a comunhão no entendimento sobre a fé, assim entendida como o pedido de readmissão do acionante, que passa pela remissão prevista nos cânones, ou seja, pela atividade extraprocessual do autor. Ante o exposto, indeferida a liminar, cite-se com observância do artigo 803 do Código de Processo Civil. Intimem-se. |
30/07/2013 | Despacho ProferidoV. RA. Após, tornem conclusos para apreciar pedido de liminar. |
30/07/2013 | Recebido pelo Distribuidor (movimentação exclusiva do distribuidor)Recebimento de Carga sob nº 9760953 |
29/07/2013 | Remetidos os Autos ao Cartório (movimentação exclusiva do distribuidor) sob nº 9760953 |
29/07/2013 | Distribuído Livremente (por Sorteio) (movimentação exclusiva do distribuidor) p/ 6ª. Vara Cível
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