sábado, 29 de junho de 2013

“Que a Igreja se reconcilie com a Teologia da Libertação”, pede Casaldáliga ao Papa.

IHU – De Pedro para Francisco, por intermédio de Adolfo. O Prêmio Nobel da Paz argentino, Adolfo Pérez Esquivel, transmitiu ao papa Francisco uma mensagem clara e direta de Pedro Casaldáliga (na foto, com as crianças): “Que aIgreja se reconcilie com a Teologia da Libertação”.

A reportagem é de José Manuel Vidal, publicada no sítio Religión Digital, 25-06-2013. A tradução é do Cepat.
Fonte: http://goo.gl/4IDny
Antes de visitar o Papa, na companhia do líder indígena Qom argentino, Félix Díaz, o Nobel argentino, Pérez Esquivel, telefonou para seu velho amigo Pedro, bispo emérito de São Félix do Araguaia, poeta, profeta dos pobres e pastor dos índios. E o bispo brasileiro de origem espanhola aproveitou a ocasião para enviar dois pedidos ao Papa: que defenda os indígenas e que reabilite a Teologia da Libertação.
“Apresentei-lhe uma mensagem de Pedro Casaldáliga, que me disse: ‘Você verá Francisco, diga para ele que procure escutar, refletir e chegar a um acordo, uma reconciliação com os teólogos latino-americanos. Que se preocupe com toda a questão dos povos originários no continente’. Para mim, isso foi um sinal positivo”, afirmou oNobel.
Após a audiência com o Papa, Esquivel reconheceu: “É verdade que existiram problemas com muitos teólogos da libertação. É preciso revisar muitas coisas. As teologias nunca são definitivas, são caminhos para construir”.
Sem saber o que o Papa fará a esse respeito, o que o pensador argentino já tem claro é que “Francisco tem um compromisso com os pobres. É um pastor e isto está manifestando continuamente. Há tempo para tudo, tem apenas 100 dias como Pontífice. Aí (no Vaticano), as mudanças não são fáceis. É preciso esperar. Não esperem mudanças rápidas porque não serão feitas. É preciso dar passos. É necessário ver e orientar para identificar o que é o melhor”.
Passo a passo, mas na direção pedida por Casaldáliga: “Eu acredito que o Papa promoverá a reconciliação com a Teologia da Libertação. O Papa é um pastor, outros foram funcionários. Esta é a diferença”.
O Pacto das Catacumbas
O Nobel argentino também revelou que, na reunião com o Papa, de 45 minutos, entregou-lhe uma cópia do chamado “Pacto das Catacumbas”, um manifesto assinado por 40 bispos, entre eles grandes personalidades latino-americanas, poucos dias antes do encerramento do Vaticano II.
Esquivel disse que o Papa, ao ver entre os assinantes Helder Câmara, Luigi Betazzi, Manuel Larraín, Leónidas Proãno, Sergio Méndez Arceo e Faustino Zazpe, exclamou: “Ui! Quem está aqui!”.
E o Nobel explica que o Papa se interessou muito pelo assunto e, embora não tenha se comprometido com nada, disse que iria pensar. De sua parte, Esquivel se comprometeu em “reunir os teólogos da Libertação, como Leonardo Boff e outros, que tanto contribuíram com a Igreja”.
A íntegra do Pacto das Catacumbas está aqui.

47 anos. O “Pacto das Catacumbas” para uma Igreja serva e pobre.

IHU – No dia 16 de novembro de 1965, há 47 anos, poucos dias antes do encerramento do Vaticano II, cerca de 40 padres conciliares celebraram uma Eucaristia nas Catacumbas de Domitila, em Roma, pedindo fidelidade ao Espírito de Jesus. Depois dessa celebração, assinaram o ”Pacto das Catacumbas”.
O documento é um desafio aos “irmãos no Episcopado” a levar adiante uma “vida de pobreza”, uma Igreja “serva e pobre”, como sugerira o Papa João XXIII.
Os signatários – entre eles muitos brasileiros e latino-americanos, embora muitos outros aderiram ao pacto mais tarde – se comprometiam a viver em pobreza, a renunciar a todos os símbolos ou privilégios do poder e a pôr os pobres no centro do seu ministério pastoral. O texto teve uma forte influência sobre a Teologia da Libertação, que surgiria nos anos seguintes.
Um dos signatários e propositores do pacto foi Dom Helder Câmara. Eis o texto.

Pacto das Catacumbas da Igreja serva e pobre

PosterMinoAsett45x65PortNós, Bispos, reunidos no Concílio Vaticano II, esclarecidos sobre as deficiências de nossa vida de pobreza segundo o Evangelho; incentivados uns pelos outros, numa iniciativa em que cada um de nós quereria evitar a singularidade e a presunção; unidos a todos os nossos Irmãos no Episcopado; contando sobretudo com a graça e a força de Nosso Senhor Jesus Cristo, com a oração dos fiéis e dos sacerdotes de nossas respectivas dioceses; colocando-nos, pelo pensamento e pela oração, diante da Trindade, diante da Igreja de Cristo e diante dos sacerdotes e dos fiéis de nossas dioceses, na humildade e na consciência de nossa fraqueza, mas também com toda a determinação e toda a força de que Deus nos quer dar a graça, comprometemo-nos ao que se segue:
1) Procuraremos viver segundo o modo ordinário da nossa população, no que concerne à habitação, à alimentação, aos meios de locomoçãoe a tudo que daí se segue. Cf. Mt 5,3; 6,33s; 8,20.
2) Para sempre renunciamos à aparência e à realidade da riqueza, especialmente no traje (fazendas ricas, cores berrantes), nas insígnias de matéria preciosa (devem esses signos ser, com efeito, evangélicos). Cf. Mc 6,9; Mt 10,9s; At 3,6. Nem ouro nem prata.
3) Não possuiremos nem imóveis, nem móveis, nem conta em banco, etc., em nosso próprio nome; e, se for preciso possuir, poremos tudo no nome da diocese, ou das obras sociais ou caritativas. Cf. Mt 6,19-21; Lc 12,33s.
4) Cada vez que for possível, confiaremos a gestão financeira e material em nossa diocese a uma comissão de leigos competentes e cônscios do seu papel apostólico, em mira a sermos menos administradores do que pastores e apóstolos. Cf. Mt 10,8; At. 6,1-7.
5) Recusamos ser chamados, oralmente ou por escrito, com nomes e títulos que signifiquem a grandeza e o poder (Eminência, Excelência, Monsenhor…). Preferimos ser chamados com o nome evangélico de Padre. Cf. Mt 20,25-28; 23,6-11; Jo 13,12-15.
6) No nosso comportamento, nas nossas relações sociais, evitaremos aquilo que pode parecer conferir privilégios, prioridades ou mesmo uma preferência qualquer aos ricos e aos poderosos (ex.: banquetes oferecidos ou aceitos, classes nos serviços religiosos). Cf. Lc 13,12-14; 1Cor 9,14-19.
7) Do mesmo modo, evitaremos incentivar ou lisonjear a vaidade de quem quer que seja, com vistas a recompensar ou a solicitar dádivas, ou por qualquer outra razão. Convidaremos nossos fiéis a considerarem as suas dádivas como uma participação normal no culto, no apostolado e na ação social. Cf. Mt 6,2-4; Lc 15,9-13; 2Cor 12,4.
8) Daremos tudo o que for necessário de nosso tempo, reflexão, coração, meios, etc., ao serviço apostólico e pastoral das pessoas e dos grupos laboriosos e economicamente fracos e subdesenvolvidos, sem que isso prejudique as outras pessoas e grupos da diocese. Ampararemos os leigos, religiosos, diáconos ou sacerdotes que o Senhor chama a evangelizarem os pobres e os operários compartilhando a vida operária e o trabalho. Cf. Lc 4,18s; Mc 6,4; Mt 11,4s; At 18,3s; 20,33-35; 1Cor 4,12 e 9,1-27.
9) Cônscios das exigências da justiça e da caridade, e das suas relações mútuas, procuraremos transformar as obras de “beneficência” em obras sociais baseadas na caridade e na justiça, que levam em conta todos e todas as exigências, como um humilde serviço dos organismos públicos competentes. Cf. Mt 25,31-46; Lc 13,12-14 e 33s.
10) Poremos tudo em obra para que os responsáveis pelo nosso governo e pelos nossos serviços públicos decidam e ponham em prática as leis, as estruturas e as instituições sociais necessárias à justiça, à igualdade e ao desenvolvimento harmônico e total do homem todo em todos os homens, e, por aí, aoadvento de uma outra ordem social, nova, digna dos filhos do homem e dos filhos de Deus. Cf. At. 2,44s; 4,32-35; 5,4; 2Cor 8 e 9 inteiros; 1Tim 5, 16.
11) Achando a colegialidade dos bispos sua realização a mais evangélica na assunção do encargo comum das massas humanas em estado de miséria física, cultural e moral – dois terços da humanidade – comprometemo-nos:
  • a participarmos, conforme nossos meios, dos investimentos urgentes dos episcopados das nações pobres;
  • a requerermos juntos ao plano dos organismos internacionais, mas testemunhando o Evangelho, como o fez o Papa Paulo VI na ONU, a adoção de estruturas econômicas e culturais que não mais fabriquem nações proletárias num mundo cada vez mais rico, mas sim permitam às massas pobres saírem de sua miséria.
12) Comprometemo-nos a partilhar, na caridade pastoral, nossa vida com nossos irmãos em Cristo, sacerdotes, religiosos e leigos, para que nosso ministério constitua um verdadeiro serviço; assim:
  • esforçar-nos-emos para “revisar nossa vida” com eles;
  • suscitaremos colaboradores para serem mais uns animadores segundo o espírito, do que uns chefes segundo o mundo;
  • procuraremos ser o mais humanamente presentes, acolhedores…;
  • mostrar-nos-emos abertos a todos, seja qual for a sua religião. Cf. Mc 8,34s; At 6,1-7; 1Tim 3,8-10.
13) Tornados às nossas dioceses respectivas, daremos a conhecer aos nossos diocesanos a nossa resolução, rogando-lhes ajudar-nos por sua compreensão, seu concurso e suas preces.
Ajude-nos Deus a sermos fiéis.

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