Carlos Ramalhete
Tem gente que faz uma festa de casamento tão complicada, que se esquece de casar.
Casamento deve ser comemorado. Sempre, nem que seja – como foi o meu, mas é uma longa história – com guaraná e biscoitos comprados na padaria ao sair da igreja. Isso porque é o casamento que encerra a primeira parte da vida. Nesta primeira etapa, somos dependentes; ainda estamos construindo as capacidades que nos tornarão membros produtivos da sociedade, sem responsabilidades que não para com nós mesmos.
A partir do momento em que nos casamos, mudamos de time na pelada e na sociedade: passamos a fazer parte daqueles de quem outros são dependentes, daqueles que têm responsabilidades para com outros e, por extensão, para com toda a sociedade. Eu, que sou casado, não posso nem me dar ao luxo de viver com a frugalidade de um monge nem gastar o dinheiro que ganhe em besteiras e prazeres. Não posso dar a louca, fazer o que me dê na telha, sair pra viajar ou passar oito horas por dia tocando saxofone.
Tenho que estar presente, nos bons e nos maus momentos. Trabalhar dobrado quando os maus momentos são da patroa, tranquilo por saber que ela estará comigo quando forem os meus. Tenho de ajudar as pessoas que surgiram desta união – meus filhos – a crescer, a ganhar essas autonomias todas que a gente precisa ter para poder um dia ser membro cotista da sociedade. A responsabilidade de ajudá-los a crescer, física, psicológica e intelectualmente, é minha e da mulher que um dia cometeu a loucura de se unir a mim.
É por isso que eu digo a meus amigos solteiros que eles são ricos: são ricos, porque o que é deles é só deles. Eles não estão, como os casados, cuidando do futuro da sociedade, e podem aproveitar bem mais o presente. Não têm responsabilidades.
É comum, no entanto, que as pessoas percam isso de vista. Que o casamento passe a ser uma festa, em vez de haver uma festa que marque algo muitíssimo maior. E como esta festa é só o que há, ela tem de ser grande, luxuosa, majestosa, mesmo. Com essa festa toda diante dos olhos, perde-se a visão do que seja o casamento. Perde-se a noção do valor dele, do compromisso que ele implica. Nunca vi estatísticas, mas, pela minha experiência, eu diria que o luxo da festa é diretamente proporcional à chance de separação. Dos votos matrimoniais – um detalhe, naquela pompa toda – serem em breve esquecidos, pisados, levados ao lixo junto com os papéis dos presentes.
Festa é bom, mas não é o casamento. O casamento é esta união de vidas, que ali só faz começar.
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