22 DE AGOSTO
17. NOSSA SENHORA RAINHA
Memória
– Santa Maria, Rainha do céu e da terra.
– Realeza de Nossa Senhora.
– O reinado de Maria exerce-se no Céu, na terra e no purgatório.
Esta festa foi instituída por Pio XII em 1954, em correspondência à fé unânime de toda a Tradição que desde sempre reconheceu a dignidade régia de Maria por ser Mãe doRei dos reis e Senhor dos senhores. Santa Maria é uma Rainha sumamente acessível, pois todas as graças nos chegam através da sua mediação maternal. A coroação de Maria como Rainha de todas as coisas criadas – que contemplamos no quinto mistério do Rosário – está intimamente ligada à sua Assunção ao Céu em corpo e alma.
I. “A MÃE DE CRISTO, efetivamente, foi glorificada como Rainha do Universo. Ela, que na Anunciação se definiu como escrava do Senhor, permaneceu fiel ao que este nome exprime durante toda a sua vida terrena, confirmando desse modo que era uma verdadeiradiscípula de Cristo, o que sublinhava fortemente o caráter de serviço da sua missão: o Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida em resgate de muitos (Mt 20, 28). Por isso, Maria tornou-se a primeira entre aqueles que «servindo a Cristo também nos outros, conduzem os seus irmãos, com humildade e paciência, àquele Rei a quem servir é reinar» (Lumen gentium, 36), e alcançou plenamente aquele estado de liberdade real que é próprio dos discípulos de Cristo: servir quer dizer reinar! [...] A glória de servir não cessa de ser a exaltação real de Maria; assunta aos céus, Ela não suspende aquele seu serviço salvífico...”1
O dogma da Assunção, que pudemos celebrar na semana passada, leva-nos de modo natural à festa de hoje: a realeza de Maria. Nossa Senhora subiu ao Céu em corpo e alma para ser coroada pela Santíssima Trindade como Rainha e Senhora da Criação: “Terminado o curso da sua vida terrena, foi assunta em corpo e alma à glória celeste. E, para que se assemelhasse mais plenamente ao seu Filho, Senhor dos senhores (cfr. Apoc 19, 16) e vencedor do pecado e da morte, foi exaltada pelo Senhor como Rainha do Universo”2.
Esta verdade foi afirmada desde tempos antiquíssimos pela piedade dos fiéis e ensinada pelo Magistério da Igreja3. Santo Efrém coloca nos lábios de Maria estas belíssimas palavras: “O Céu sustente-me com os seus braços, porque sou mais honrada do que ele mesmo. Pois o Céu foi apenas o teu trono, não a tua mãe. Quantas vezes é mais digna de honra a Mãe do Rei do que o seu trono!”4
Foi muito freqüente exprimir este título de Maria mediante o costume de coroar as suas imagens de forma canônica, por concessão expressa dos Papas5. Desde os primeiros séculos, a arte cristã representou Maria como Rainha e Imperatriz, sentada em trono real, ornada com as insígnias da realeza e rodeada de anjos. Não poucas vezes retratam-na no momento em que é coroada pelo seu Filho. E os fiéis recorreram a Ela com orações como a Salve-Regina, Ave Regina Caelorum, Rainha do céu, alegrai-vos..., tantas vezes repetidas.
Também não são poucas as vezes em que temos recorrido a Ela recordando-lhe esse formoso título da sua realeza no marco do quinto mistério glorioso do Santo Rosário. Hoje, na nossa oração, fazemo-lo de modo especial.
“És toda formosa, e não há mancha em ti. – És horto cerrado, minha irmã, Esposa, horto cerrado, fonte selada. – Veni, coronaberis. – Vem, serás coroada (Cânt 4, 7.12 e 8).
“Se tu e eu tivéssemos tido poder, tê-la-íamos feito também Rainha e Senhora de toda a criação.
“Um grande sinal apareceu no céu: uma mulher com uma coroa de doze estrelas sobre a cabeça. – O Pai, o Filho e o Espírito Santo coroam-na como Imperatriz que é do Universo.
“E rendem-lhe preito de vassalagem os Anjos..., e os patriarcas e os profetas e os Apóstolos..., e os mártires e os confessores e as virgens e todos os santos..., e todos os pecadores, e tu e eu”6.
II. EIS QUE CONCEBERÁS e darás à luz um filho, a quem porás o nome de Jesus. Ele será grande e será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai Davi; e reinará eternamente na casa de Jacó; e o seu reino não terá fim7, lemos no texto do Evangelho da Missa de hoje.
A realeza de Maria está intimamente relacionada com a do seu Filho. Jesus Cristo é Rei porque lhe compete um poder pleno e completo, tanto na ordem natural como na sobrenatural; é uma realeza própria e absoluta, além de ser plena. A realeza de Maria é plena e participada da do seu Filho. Os termos Rainha e Senhoraaplicados à Virgem não são uma metáfora; com eles, designamos uma verdadeira superioridade e uma autêntica dignidade e poder nos céus e na terra. Por ser Mãe do Rei, Maria é verdadeira e propriamente Rainha, encontra-se no cume da criação e é efetivamente a primeira pessoa humana do Universo. “Belíssima e perfeitíssima, tem tal plenitude de inocência e santidade que não pode conceber-se outra maior depois de Deus”8.
Os títulos da realeza de Maria são a sua união com Cristo como Mãe e a associação com o seu Filho Rei na redenção do mundo. Pelo primeiro título, Maria é Rainha-Mãe de um Rei que é Deus, o que a enaltece sobre todas as criaturas humanas; pelo segundo, Maria Rainha é dispensadora dos tesouros e bens do Reino de Deus, em virtude da sua corredenção.
Na instituição desta festa, Pio XII convidava os fiéis a aproximar-se deste “trono de graça e de misericórdia da nossa Rainha e Mãe para pedir-lhe socorro na adversidade, luz nas trevas, alívio nas dores e penas”; e animava todos os cristãos a pedirem graças ao Espírito Santo e a esforçarem-se por detestar o pecado e livrar-se da sua escravidão, “para poderem render um preito de vassalagem constante, perfumado com a devoção de filhos”, a quem é Rainha e tão grande Mãe9. Adeamus ergo cum fiducia ad thronum gratiae, ut misericordiam consequamur... “Aproximemo-nos, pois, confiadamente do trono da graça, a fim de alcançarmos misericórdia e encontrarmos graça para sermos socorridos no momento oportuno”10. Este trono, símbolo da autoridade, é o de Cristo, mas Ele quis que fosse na sua Mãe, trono de graça, que mais facilmente alcançássemos a misericórdia, pois Ela nos foi dada “como advogada da graça e Rainha do Universo”11.
Contemplamos hoje uma grande festa no céu. A Santíssima Trindade sai ao encontro da nossa Mãe, assunta aos céus por toda a eternidade.
“É justo que o Pai, o Filho e o Espírito Santo coroem a Virgem Santíssima como Rainha e Senhora de toda a criação. – Aproveita-te desse poder e, com atrevimento filial, une-te a essa festa do Céu. – Eu corôo a Mãe de Deus e minha Mãe com as minhas misérias purificadas, porque não tenho pedras preciosas nem virtudes. – Anima-te!”12
A Virgem espera-nos; quer que nos unamos à alegria dos Santos e dos Anjos. E temos o direito de participar de uma festa tão grande, pois trata-se da nossa Mãe.
III. APARECEU NO CÉU um grande sinal: uma mulher vestida de sol, com a lua debaixo dos pés e uma coroa de doze estrelas sobre a cabeça13. Essa mulher, além de representar a Igreja, simboliza Maria14, a Mãe de Jesus, que no Calvário foi entregue a João para ser cuidada por ele. O discípulo cumpriu com esmero esse encargo e pôde contemplá-la muitas vezes. Quando, já velho, passava para o papel as suas visões, Maria já exercia a sua realeza no Céu.
Os três traços com que o Apocalipse descreve Nossa Senhora são símbolo dessa dignidade: vestida de sol, quer dizer, resplandecente de graça por ser a Mãe de Deus; com a lua debaixo dos pés, como soberana que é de todas as coisas criadas; e uma coroa de doze estrelas, expressão da sua coroa real, do seu reinado sobre todos os anjos e santos15. Na ladainha do terço, recordamos todos os dias que Ela é Rainha dos Anjos, dos Patriarcas, dos Profetas, dos Apóstolos, dos Mártires, de todos os santos... É também a nossa Rainha e Senhora.
O reinado de Maria exerce-se diariamente em toda a terra, pois é Ela que distribui a mãos cheias a graça e a misericórdia do Senhor. Em correspondência, devemos colocar-nos muitas vezes na sua presença, reconhecendo-a como Rainha. Muitos cristãos, aos sábados e quando visitam os seus inumeráveis santuários, cantam-lhe ou rezam-lhe com devoção essa antiga oração que é a Salve-Rainha: Salve, Rainha, Mãe de misericórdia, vida, doçura, esperança nossa...
Esse reinado é exercido no Céu sobre os Anjos e sobre todos os bem-aventurados, que aumentam a sua glória acidental “pelas luzes que Maria lhes comunica, pelas alegrias que experimentam na sua presença, por tudo quanto Ela faz pela salvação das almas”16.
O reinado de Maria exerce-se também no Purgatório. “Salve, Rainha, cantavam as almas que vi sentadas sobre a relva e entre as flores que não se viam de fora do vale”, declara o poeta italiano17. A nossa Mãe anima-nos constantemente a pedir e a oferecer sufrágios pelos que ainda se purificam no Purgatório; apresenta a Deus as nossas orações por eles, aumentando assim o seu valor. Aplica a essas almas, em nome do seu Filho, os frutos dos méritos que Ele nos alcançou e os dos seus próprios méritos. A nossa Mãe é uma boa aliada no nosso esforço por ajudar as almas do Purgatório, e, se procurarmos a sua intimidade, estimular-nos-á também a purificar as nossas faltas e pecados já nesta vida, permitindo assim que possamos contemplá-la imediatamente depois da morte, sem termos que passar por esse lugar de espera e de purificação.
Ó Deus, que fizestes a Mãe do vosso Filho nossa Mãe e Rainha, concedei-nos, por sua intercessão, que alcancemos o reino do céu e a glória prometida aos vossos filhos18.
(1) João Paulo II, Enc. Redemptoris Mater, 25-III-1987, n. 41; (2) Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 59; (3) cfr. Pio XII, Enc. Ad coeli Reginam, 11-X-1954; (4) Santo Efrém, Hino sobre a Bem-aventurada Virgem Maria; (5) J. Ibañez-F. Mendoza, La Madre del Redentor, Palabra, Madrid, 1988, pág. 293; (6) Josemaría Escrivá, Santo Rosário, Quinto mistério glorioso; (7) Lc 1, 31-33; (8) Pio IX, BulaIneffabilis Deus, 8-XII-1854; (9) Pio XII, op. cit.; (10) Hebr 4, 16; (11) Missal Romano, Prefácio da Missa da festa; (12) Josemaría Escrivá, Forja, n. 285; (13) Apoc 12, 1; (14) São Pio X, Enc. Ad diem illum, 2-II-1904; (15) cfr. L. Castán, Las Bienaventuranzas de Maria, BAC, Madrid, 1971, pág. 320; (16) R. Garrigou-Lagrange, La madre del Salvador, Rialp, Madrid, 1976, pág. 323; (17) Dante Alighieri, A divina comédia, Purgatório, 7, 82-84; (18) Missal Romano, Oração coleta da Missa.
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